A Prova Ilícita no Processo do Trabalho e sua Utilização como Prova Emprestada - Por Alexandre Nardiello
Direito em Foco
01 Setembro, 2018
A Prova Ilícita no Processo do Trabalho e sua Utilização como Prova Emprestada
O Direito Constitucional Processual apresenta como um de seus princípios fundamentais, o da liceidade dos meios de prova. Conforme esse princípio, que tem por objetivo assegurar o respeito ao devido processo legal, são inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5°, LVI, da CF). Prova ilícita é aquela obtida em violação a normas legais ou constitucionais (art.157, do CPP). A violação dá-se em regra de direito material e sua obtenção é extraprocessual (como exemplos, a confissão mediante tortura e a interceptação telefônica). Ainda, não é nula, é inadmissível, o que leva ao seu desentranhamento do processo.
Não há que se confundir prova ilícita com prova ilegítima, que é a obtida mediante a violação de normas de direito processual. Nesse caso, a prova é obtida dentro do processo e seu reconhecimento não faz com que seja desentranhada do mesmo. Exemplo é o depoimento do absolutamente incapaz.
A proibição da prova ilícita no processo é interpretada através de três posicionamentos distintos, observados na doutrina e na jurisprudência. O primeiro veda totalmente a utilização da prova ilícita no processo. Em contrapartida, a corrente permissiva admite a prova obtida por meio ilícito, mas desde que seu conteúdo seja lícito. A última vertente, considerada a intermediária, exige a análise dos interesses em jogo, devendo ser observada a proporcionalidade e a ponderação de interesses.
Fruto do direito alemão, o princípio da proporcionalidade tem sido utilizado para dirimir a colisão entre princípios fundamentais. No Direito Processual, o magistrado que o aplicar, deverá pautar-se por critérios axiológicos. Isso, para ao final determinar qual será o princípio que será utilizado para que o processo seja justo e efetivo.
O Excelso Supremo Tribunal Federal, pautando-se na proporcionalidade, passou a admitir como lícita a gravação de conversa telefônica efetuada por um dos interlocutores. Entretanto, nega admissibilidade à interceptação telefônica que ocorre quando nenhum dos interlocutores tem conhecimento de que sua conversa está sendo gravada. Nesse caso, a licitude só ocorre mediante autorização judicial para fins de prova no processo criminal.
No processo do trabalho, a proporcionalidade tem conduzido, via de regra, a análise sobre a admissibilidade ou não das provas ilícitas. Reconhecendo que nenhum direito ou princípio fundamental é absoluto, e também considerando a hipossuficiência probatória do empregado, a jurisprudência tem admitido a utilização de provas obtidas por meios ilícitos. Como exemplo, o caso em que o empregado se apodera de documentos internos da empresa para que sejam utilizados no processo. À falta de outros meios probatórios, a dignidade do trabalhador tem sido prestigiada em detrimento do segredo de empresa. Outro caso em que tem sido admitida a prova obtida por meios ilícitos é o da gravação sub-reptícia utilizada por empregada que pretende provar o assédio sexual que foi praticado por seu superior hierárquico.
Uma vez admitida a licitude da prova produzida em um processo, a doutrina e a jurisprudência não são pacíficas sobre a possibilidade de sua utilização como prova emprestada. Para uma corrente, o uso só é possível caso as partes do processo, em que a prova foi produzida, sejam as mesmas do processo atual. Assim, uma gravação telefônica que no primeiro processo serviu de prova para o pedido de indenização por dano moral poderá ser utilizada em outro que pleiteia dano patrimonial, conhecido somente em momento posterior.
Com a devida vênia ao posicionamento anterior, também neste caso deve-se aplicar a proporcionalidade para permitir que a prova ilícita produzida em outro processo seja utilizada no atual, ainda que envolvendo apenas uma das partes. Isso porque cada caso exige a análise da possibilidade e dificuldade da produção de provas e os direitos que estão sendo defendidos em juízo. Caso uma empregada tenha gravado imagens que atestam o assédio sexual praticado por seu superior hierárquico em face dela e de outra colega de trabalho, não parece razoável que seja negado à outra trabalhadora a utilização dessa mesma gravação que consta como prova no processo ajuizado por aquela que gravou os fatos.
Em suma, infere-se que a admissibilidade da prova ilícita no direito processual, a par das demais correntes, deve ser analisada a partir da realidade fática, observada a viabilidade probatória e os direitos que estão sendo defendidos. A mesma conclusão deve ser aplicada ao caso em que se pretende utilizar a prova ilícita como prova emprestada, pois conforme visto, a liceidade dos meios de prova é um princípio que pode ceder, no caso concreto, a outro que, uma vez aplicado, resultará em uma decisão mais justa e equânime.